terça-feira, 20 de dezembro de 2011

De Raquel Rolnik, no site do Le Monde Diplomatique Brasil, de dezembro de 2011.


Manifesto em defesa do Cine Belas Artes, patrimônio cultural, artístico e afetivo de São Paulo e do Brasil

Amparados na Constituição Federal, que inclui as “edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais” entre os bens que “constituem o patrimônio cultural brasileiro” (inciso IV do Artigo 126), defendemos o imediato tombamento do prédio da Rua da Consolação, 2.423, esquina com a avenida Paulista, onde funcionava o mítico Cine Belas Artes. Também demandamos das autoridades que lancem mão de todos os instrumentos necessários para reabrir o cinema, inaugurado em 1967 pela Sociedade Amigos da Cinemateca (SAC) e Companhia Serrador no mesmo prédio que antes abrigara o Cine Trianon, aberto em 1952.
Desde sua inauguração, o Cine Belas Artes manteve as características que demarcaram sua singularidade no circuito exibidor e tornaram-no fundamental para a cultura cinematográfica no Brasil. Ao longo de 44 anos, operou mais como um centro cultural formador de público do que mera sala exibidora, como atestam dois de seus aclamados projetos, o Cineclube e o Noitão, que, diferentemente das salas de shopping, promoviam uma atmosfera propícia à interação. Contou para isso com a preciosa contribuição de Ancona López, reconhecido internacionalmente como um dos melhores programadores de cinema e que teve Leon Cakoff como seu assistente. Soube, também, adaptar-se à nova tendência de complexos com salas pequenas e médias ao transformar seu espaço no mais significativo multiplex de rua do país.
O Cine Belas Artes promovia a diversidade cultural e a reflexão sobre dramas humanos, história, política e arte por meio de uma programação com filmes de alto padrão, brasileiros e estrangeiros, inclusive com elevado número de obras-primas procedentes de países pouco presentes no nosso mercado exibidor. Desempenhava papel fundamental no circuito cultural das ruas da Consolação e Augusta e Avenida Paulista. Nos fins de semana e feriados, recebia, em média, 1.800 frequentadores por dia. As filas se repetiam e lotavam suas salas também às segundas e quartas-feiras nas tradicionais promoções com ingressos mais baratos. Esse sucesso era favorecido igualmente pela facilidade de acesso a pé e por transporte público.
Entretanto, pressões do mercado imobiliário provocaram a suspensão das atividades do cinema em março deste ano. O fato recebeu ampla divulgação na mídia.  Frequentadores realizaram protestos na internet e na rua contra o fechamento e organizaram o Movimento pelo Cine Belas Artes (MBA). Centenas de depoimentos pró-Belas Artes, um abaixo-assinado com cerca de 20 mil assinaturas e adesões de quase 90 mil pessoas no aplicativo Causes no Facebook são apenas alguns exemplos do que é visto como uma das maiores mobilizações em defesa de um patrimônio cultural no Brasil. Destacamos que este uníssono de vozes em São Paulo coincide com o movimento de resgate histórico dos cinemas de rua em curso no Rio de Janeiro, que contempla a reabertura do igualmente mítico Cine Paissandú (tombado em 2008), anunciada para julho de 2012.
Garantir o cinema de rua é valorizar um modo de vivenciar a cidade com seus bares, restaurantes, livrarias, as pipocas e as pizzas e os encontros com amores, amigos e conhecidos. É, acima de tudo, um exercício de cidadania – lugar de comunhão entre memória, cultura e afeto – que deve ser protegido e fomentado pelo Poder Público.
Movimento pelo Cine Belas Artes (MBA)
Adesões ao manifesto devem ser enviadas para (copiar os três e-mails): albergon@gmail.comantoniomourareis@gmail.commanfrelia@gmail.com

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